domingo, janeiro 29, 2012

Saudades de uma certa tormenta


Parece mentira, mas moro a umas seis quadras do mar, no litoral gaúcho, e somente no último fim de semana pude, de fato, me esticar na areia, tomar um banho de mar e limpar as impurezas de 2011 com muito sal grosso.

Só que cá pra nós, trabalho e praia não combinam. Pelo menos não com pessoas neuróticas e perfeccionistas (like me), porque na mente dessas pessoas uma chegadinha na beira da praia seria o mesmo que matar o trabalho, ainda que isso ocorra fora do expediente, o que traria sérios conflitos mentais.

Ademais, sobretudo e todavia, se banhar no litoral gaúcho é o mesmo que entrar em uma piscina de leite com nescau, um verdadeiro “chocolate”. Quem veraneia no litoral gaúcho ou lá mora sabe bem o que eu estou falando. Sem falar no repuxo e nas ondas fortes que tornam o banho de mar um verdadeiro “banho tcheco”. Desculpem, mas verdade seja dita.

Plataforma Marítima de Tramandaí, RS, e o mar "chocolate"
E então me vi com saudades de uma certa tormenta que pegamos no Caribe em outubro.

Desembarcamos no aeroporto internacional de Cancun, na Península de Yucatán, México, carregados de muambas provenientes de Miami e de Orlando, cansados das longas caminhadas nos parques da Disney e da Universal Studios e do decréscimo de nosso poderio econômico, e logo no início fomos levados a um blá blá blá de passeios mais baratos, time-sharing camuflado e, é claro, da chegada do furacão “Rina” previsto para “aquela” semana.

Chegando no hotel fomos muito bem recepcionados, todos sorrindo e gentis, champagne liberada no hall de entrada, check in mais cedo, razão pela qual nem me preocupei com o tal furacão, pois caso fosse “muito” sério, nem teriam permitido que desembarcássemos lá. Certo?

Errado.

Cada turno do dia um novo boletim espalhado pelos elevadores, hall de entrada, restaurantes e corredores do hotel. Primeiro, Rina atacaria a Ilha de Cozumel (daí nem cogitamos visitá-la, só por segurança), causando transtornos em Cancun e no aeroporto, sendo que os hóspedes deveriam entrar em contato com suas agências de turismo acerca da possibilidade de troca de voos, pois o aeroporto em algum momento iria fechar.

Nós não ligamos pra ninguém, literalmente e metaforicamente falando.

Passou-se o primeiro dia e aproveitamos para olhar aquele marzão verde-água, parecia filme. Só faltava mesmo o Jack Sparrow passar por ali e dar uma abanadinha, de sunga e protetor solar banana boat. No fim do dia o tempo se fechou e no horizonte tudo ficou escuro...


Rina a caminho
No segundo dia chuva o dia inteiro. Vento forte. Os empregados do hotel forravam grandes janelas de vidro com tábuas de madeira e novos boletins eram afixados nos lugares de fácil acesso. Um ar de seriedade pousou em Cancun.


caindo a ficha?
Bem, se é para esperar o furacão, que seja em grande estilo. 
Me dei o luxo de pagar um pacote no SPA do hotel com tudo o que eu tinha direito, afinal de contas, como diria o cirurgião plástico do Coringa: “se é pra ir, que seja com um sorriso no rosto”.
Saí do SPA me sentindo uma geleia de tão zen. Tinha esquecido por completo a história do furacão, porque na minha cabeça aquilo tudo era só “mídia”.

E foi naquela noite que tivemos que acatar as regras do último boletim de informações, que ao invés de prever um furação previa uma tormenta, o que pra mim não fazia qualquer diferença, até perceber que a tormenta chegaria com bem menos força e que só traria água e vento forte, ao contrário do furacão, que traria vacas, carros, hotéis, turistas e nativos voando pelos ares, como no filme Twister.

Assim, nas doze badaladas notúrnicas tivemos que guardar todas as nossas coisas nas malas, colocá-las dentro da banheira, fechar a porta do banheiro, guardar documentos e passagens no cofre, vestir roupas leves (abrigos travestidos de pijamas), não beber mais do que 4 (quatro) latinhas de cerveja por quarto (alguém acabou se dando bem nessa parte) e levar travesseiros para o salão de eventos do hotel.

Nossa, aquilo me chateou de tal maneira porque já estava quase entrando em modo delta sono... jamais acordem uma leonina no meio da noite, ainda mais para trocar de ninho (nem que seja por causa de um "furacão", ora bolas). Mesmo assim eu não achava que teríamos que dormir fora do quarto, não via nenhuma necessidade pra isso. Eu realmente não tinha a menor noção do que estava acontecendo, ou do que podia acontecer.

Não foi permitido chegar na parte externa do hotel e nem se quiséssemos conseguiríamos, pois o vento e a chuva forte estavam em todos os cantos, produzindo sons mais assustadores do que Jason em "Sexta-feira13".


ao fundo dois seres humanos de capa de chuva amarela tentando cruzar o corredor
Todos os hóspedes foram alojados em pequenos colchões no salão de eventos, mesinhas intercaladas com água e no hall de entrada uma grande mesa com chás, cafés, biscoitos e outras guloseimas.


o auge do Rina
Depois de colocarem pra tocar “Imagine”, do John Lenon, e de um americano ao lado da gente comentar que com aquela música só cortando os pulsos, foi hora de me entregar ao sono profundo, pois eu já tinha visto tudo o que precisava para seguir adiante, fosse na vida real, fosse em um plano espiritual superior. Cancun, mar verde-água, furacão, resort com all inclusive, hóspedes alojados no salão de eventos do hotel, barulhos assustadores do lado de fora... ampf!

E depois daquela noite surreal acordamos com o barulho dos funcionários do hotel organizando o café da manhã no salão de eventos. Ao sair do “abrigo”, a surpresa. Sem feridos, sem estragos.



a nova cara do hotel após o Rina
E um novo dia se apresentou pra nós.
Como dizem os filósofos: “depois do vendaval, a calmaria”.


sem legenda
















Aí sim, férias merecidas.
Um mar de verdade.
Chocolate só em barra, pra saborear depois da janta.

Um comentário:

Aline Branco disse...

Hahaha! Bah! Imagine!? Tá louco!